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Foto do escritorJoana Miguel Meneses

“Carcaça”: A fronteira flexível entre o passado e o presente

A peça de Marco da Silva Ferreira, que marcou o arranque da segunda semana da 12.ª edição do GUIdance fez-nos pensar sobre as barreiras que (ainda) existem e sobre como as podemos (ou não) quebrar. Uma peça que partiu do pensar em identidade coletiva. “Que identidades coletivas é que se estão a construir? Que identidade coletiva contrói este grupo em particular?”.


© Cláudia Crespo

Há alguém que tenha saído do grande auditório do Centro Cultural Vila Flor e não tenha tentado fazer o movimento que marca “Carcaça”? Foi um movimento que nasceu já em 2019, quando o coreógrafo Marco da Silva Ferreira trabalhou com a Companhia Nacional de Bailado, e que nos é apresentado ao longo da hora que passamos a contemplar os dez bailarinos. Mas o bailarino trouxe também muito material da sua primeira peça, “Hu(R)mano”: “uma energia ou um cardio semelhante”, acredita.


Se às danças tradicionais tirarmos o conteúdo, o que fica? É a geometria que se cria em palco, são as danças em círculo.


“Carcaça” é, neste sentido, um cruzamento de danças sociais e da tradição com o contemporâneo. “Não me conseguia desligar de ser português, contemporâneo, viver neste tempo, altamente globalizado, em que as barreiras geográficas se diluíram de uma maneira virtual”, explicou o coreógrafo.


E pensar em identidade coletiva é pensar também, por exemplo, no Folclore, que foi dança de construção e definição da identidade de quem somos. Porém, essas danças passaram por “um processo altamente autoritário, totalitário, instrumentalizado, que fetichizava com os corpos dominados”. É por isso que, a dada altura, isso deixa de servir e há uma necessidade de provocar um afastamento para mais tarde as voltar a olhar.


Foi a isso que Marco da Silva Ferreira se propôs: voltar a olhar para as danças sociais “com um olhar distante e perceber o que é que motivou estas coisas”. “Ao trabalhar a peça tentei trabalhar estas danças formais que inicialmente não eram formais mas que, entretanto, ficaram só forma. Já não temos conteúdo, tornaram-se umas carcaças”, acrescentou na conversa que manteve com o público após o espetáculo.


O bailarino e coreógrafo quis, com “Carcaça”, provocar este encontro de gerações e de tempos, com o passado e o presente, mas também provocar um encontro com as danças da atualidade, nomeadamente do clubbing, techno ou house. E isso torna-se visível com relações que são, literalmente, físicas, de comportamento, de passos, da transição de peso e da própria energia.


Uma peça que se assume otimista

Um encontro que se quis provocar pensando que este “é sempre otimista”. “É uma utopia”, acredita. “A dada altura haverá um sítio onde o presente e o passado se encontram e há harmonia. Mas não é completo, não é narrativo, não acaba. São possibilidades”, diz lembrando que, quando os muros caem, “não quer dizer que as coisas fiquem melhores. Não há a ingenuidade de pensar isso, mas há qualquer coisa que se torna mais verdade, pode ser pior ou pode ser mais difícil”.


Em palco, dez bailarinos. Dez bailarinos que nunca estão sozinhos e que têm espaço e tempo para serem quem são, individualmente. Porque ainda que os movimentos sejam os mesmos para todos, cada um faz imprimindo o seu cunho e a sua origem. “Eu queria que os sujeitos existissem, os sujeitos são eles e eu queria que eles fizessem parte da peça”, justificou.


Todos eles acrescentam algo novo à identidade daquele grupo, mas também trazem algo sobre o passado da dança e da própria história da Portugal e das suas ex colónias, através do kuduro ou do samba.


É também neste ponto que as fronteiras se cruzam, que os muros se levantam, mas também caem. E ao falar em muros fala-se em limites, “não só limites geográficos, mas também os emocionais, os de identidade, identidade cultural… E esses são flexíveis e também às vezes caem”.


Marco da Silva Ferreira procurou, ao ligar artes e linguagens, ligar épocas e mostrar que “a luta é feita não só com a força do músculo”, mas também “com outros tons, com os olhares e com outro tempo”. E, partindo daí, parece que avistamos um futuro risonho, colorido – sem muros. Afinal, “todos os muros caem”.


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