“Estilhaços” é o mais disco de Theo e vem provar que o rock, seja em que língua for, não está morto. À conversa com João Gonçalves, nos arcos entre a Oliveira e a praça de Santiago, a Mais Guimarães quis explorar os caminhos que este álbum toma e conhecer melhor o artista vimaranense que se inspira nos anos 90.
Depois de um EP e de um álbum em inglês, aventuraste-te em Estilhaços, 100% português. Como é que surge este álbum?
Surgiu de uma forma muito espontânea. Depois dos outros dois em inglês, tentei experimentar algo novo e comecei a compor em português. Compus as primeiras músicas… De início, tinha ideia de fazer só um EP, em português, e até cheguei a anunciar dois EPs, um em português e outro em inglês. Mas as coisas foram fluindo com muita rapidez e, quando dei por mim, já tinha feito oito músicas e já tinha feito um disco. Resolvi lançar o disco, por isso, em português.
Se não me engano, “Na Tua Pele” foi o primeiro single que apresentas-te. Porquê essa escolha?
O “Na Tua Pele” foi das primeiras músicas que compus para este disco e achei que era um tema forte e que tinha uma malha rock que me caraterizava de discos anteriores e achei que fazia todo o sentido lançá-lo como primeiro single, como primeira amostra do disco.
Estamos nos arcos, entre a Oliveira e a praça de Santiago. Foi o lugar que serviu de inspiração para uma música.
Por acaso, coincidência das coincidências, sim. A primeira música do disco, “Osso”… A letra foi mais ou menos elaborada num dia, à noite, aqui. Estava no Oub’Lá e resolvi apanhar um bocadinho de ar e vim até aqui. Escrevi no telemóvel algumas partes da letra, que de início até se chamava “Guimarães à Noite”. Depois resolvi não ser muito direto. Não gosto de ser muito direto nas letras e resolvi tirar essa parte, mas fala da praça à noite.
Perguntava-te precisamente como é que surge a inspiração para escrever estas oito músicas.
Foi tudo rápido, tudo fluído, surgindo muito naturalmente. Essa música até pode servir como exemplo. Já tinha a parte do instrumental toda definida, já tinha algumas partes de letras. Depois, surge do nada. Estou sozinho, estou num momento mais íntimo e faço a letra. Fiz a letra no sábado e no domingo estava gravado.
Apesar de ser um estilo muito próprio, o rock, sinto que neste álbum há quase que uma viagem a diferentes mundos…
Fui pensando neste disco como um todo. Por isso, se calhar, são oito músicas em vez de quatro.A maioria das bandas lança EPs, porque não vale muito a pena lançar discos. Mas, para mim, é mais fácil fazer oito músicas porque o contexto é o mesmo. Apesar dos vários mundos, fala sempre de relações. É tudo um bocado romântico, desencontros amorosos, muito à volta disso. Com quatro músicas às vezes é difícil dares a tua visão completa do assunto. Mesmo o meu anterior EP tinha seis faixas. Gosto de criar o contexto todo no disco.
Primeiro música e depois letra?
Normalmente. Mas não obedece muito, não é bem assim. Em oito, se calhar duas foi a letra primeiro.
Mas sempre escrito por ti?
Sempre escrito por mim.
Terminas o álbum com caos. É no caos que vivem os artistas?
A vida de um artista, no meu nível, na minha liga, é um caos, é muito complicado seres artista. Tens a tua família, tens o teu trabalho, não vives disto. Teres tempo para fazer um disco é obra.
Sentes que, vivendo tu em Guimarães, Guimarães dá os apoios necessários aos músicos que querem e estão a começar?
Guimarães dá muitos apoios, mas, geralmente, aos que estão a começar é difícil. Nos meus três discos, e vamos falar disto sem rodeios, pedi apoio e não tive em nenhum. Se calhar no quarto, quem sabe. Mas acho que sim, Guimarães, no fundo, tem apoiado vários projetos.Felizmente, temos muitos projetos em Guimarães. Muita arte, muita cultura, muito artista novo, desconhecido… Trabalho numa escola de música e vejo que há muita criatividade em Guimarães, há muitos jovens, que nós não conhecemos, que têm um talento extraordinário. Estão guardados e estão a surgir cada vez mais. Guimarães tem apoiado e evoluído muito nesse sentido.
Há outras pessoas que têm um papel importante em ti enquanto artista. Este disco teve um produtor que não é português. Como é que o descobriste?
Descobri o Tyla numa rede social. Começamos a falar já não me recordo bem sobre quê e fiz aquela pesquisa de “quem é?”. Vi que ele era produtor, começamos a falar sobre música, comecei a falar sobre o meu estilo. Surgiu um risco da minha parte, pus-lhe o meu trabalho nas mãos e não o conhecia muito bem. Mas ele respondeu sempre com seriedade e fez um trabalho brutal, sempre entendeu bem as minhas linhas, e tenho muito a agradecer ao Tyla.
Não estando ele em Portugal, como é que foi o processo de criação do disco?
Eu falo com ele pelo Messenger, mando-lhe a minha ideia, ele manda a visão dele da música. Concordo às vezes, outras não concordo… Funciona assim. Troca de ficheiros para Itália. Quando comecei ele só me tinha praticamente a mim como cliente, agora já tem uma lista enorme fruto do trabalho dele.
Dizes que te inspiras muito nos anos 90. Quem são as tuas maiores inspirações?
Sou do grunge, dos anos 90. Eu e o Pedro Conde, que também me ajuda muito neste processo. Gostamos de Pearl Jam, Nirvana, Foo Fighters, Smashing, por aí… É mais ou menos o nosso estilo base. Se calhar, a nossa sonoridade já não é muito virada para esse estilo, mas serviu-nos como base e influência.
E vens mostrar que o rock não está morto?
Espero que sim. Acho que o rock não está morto. Não temos tido muita possibilidade de consumir rock em Guimarães, infelizmente. Agora existem muitos estilos e muita coisa diferente. Guimarães está um bocadinho virado para a eletrónica, para os DJs, mas toquei no Rock in Febras, com bandas totalmente desconhecidas do rock, que deram o seu primeiro concerto lá. Foi um sucesso. Estava a abarrotar de gente. Foi uma festa muito bonita. As bandas, apesar de ser o primeiro concerto, responderam bem. Foi um exemplo, porque o rock, aqui no município, no concelho, está vivo.
Às vezes, acredita-se que não há público para tudo. Mas há público para o rock, também, em Guimarães.
Acho que sim. Acho que as nossas raízes vêm do rock. Aqui há uns anos, aquilo que havia de concertos para os mais jovens era rock, não era a eletrónica. Não estou a criticar, mas não é, de todo, o meu estilo, nem é isso que me faz sair de casa.
Voltando agora um bocadinho atrás… Como é que tu, enquanto João, decides que queres avançar com este projeto?
Foi na pandemia. Estive dois meses em casa com o meu filho e, como quem joga Playstation ou computador, dediquei-me à composição. Tenho um pequeno estúdio em casa e passei lá algum tempo. Na altura tinha outra banda, mas foi aí que decidi avançar sozinho.
E como é que a música surgiu na tua vida?
Na minha vida, a música sempre esteve presente. Sempre gostei de pegar numa raquete e, em frente ao espelho, dar concertos. O primeiro passo a sério foi no Rock in Taipas, um festival de rock. Havia muita união, na altura, entre os participantes. Tinha 18, 17 anos. Fiz a minha primeira banda a quinze dias do Rock in Taipas e em quinze dias arranjámos cinco músicas e fomos tocar. Foi uma aventura. A partir daí, há o bichinho de quem pisa um palco pela primeira vez. Fiquei viciado.
Quais são os planos do Theo para o futuro?
Quero parar um pouquinho com a composição, porque é difícil, no meu caso, que tenho de recorrer a músicas freelancer, estar sempre a inserir músicas novas num espetáculo. Quero deixar pousar um bocadinho as coisas, quero preparar um espetáculo com estas músicas todas, porque ainda só introduzir quatro ao vivo. Quero tocar e desfrutar do disco. Acho que estou muito orgulhoso com este disco.
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