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Foto do escritorJoana Miguel Meneses

Capital Europeia da Cultura: Um ponto de partida

Recuamos a 2012 dez anos depois. O ano que convidou todos os vimaranenses a “fazer parte” de uma cidade que se transformou em Capital Europeia da Cultura.

© Cláudia Crespo

“É difícil conseguir encontrar um momento daquilo que Guimarães 2012 significou, daquilo que Guimarães 2012 foi em termos de intensidade”. Quem o diz é José Bastos que recorda 2009, quando foi feito o anúncio de que Guimarães seria candidata à Capital Europeia da Cultura (CEC). “Tempos muito intensos” que o programador de Espaço Público da CEC considera “marcante para aquilo que, na altura, esperávamos que pudesse vir a ser e que, em grande medida, se confirmou que viria a ser”.


Na verdade, não foram apenas 366 dias que fizeram aquele ano. Também os “tempos de preparação prévia e os momentos que se seguiram a 2012 foram importantes e determinantes naquilo que 2012 significou”. Em outubro de 2006 foi submetida a nomeação da cidade de Guimarães como candidata a Capital Europeia da Cultura e, em dezembro de 2007, apresentada a candidatura. Um ano depois, é reconhecida a qualidade do projeto de Guimarães e o painel de seleção recomenda a cidade à Comissão Europeia. Em maio de 2009, o Conselho Europeu de Ministros da Cultura designa Guimarães como uma das capitais da cultura 2012, conjuntamente com Maribor, na Eslovénia. A 21 janeiro de 2012, aconteceu o primeiro grande evento, a cerimónia de abertura de Guimarães 2012 Capital Europeia da Cultura.


O próprio José Bastos viu o ano da Capital Europeia da Cultura como o início de algo. “2012 não era um ponto de chegada, 2012 seria um ponto de partida e, tendo sido um ano muito intenso, com uma enorme vibração enquanto atividade cultural e artística em Guimarães, aquilo que 2012 significou foi, claramente, na minha perspetiva, uma viragem de página naquela que era a abordagem que Guimarães fazia e fez à Capital Europeia da Cultura e à importância que a cultura desde há muitos anos tinha para Guimarães e que saiu claramente reforçada em 2012 e pós 2012”.

Assim nasceu 2012, entre afetos

O Multiusos de Guimarães recebeu a cerimónia de abertura de Guimarães 2012 intitulada Os Nossos Afetos. Um espetáculo “onde música, performance e multimédia fundem a cultura popular e erudita, com inspiração nas memórias individuais e coletivas da cidade e da Europa”, lia-se na sinopse.


“Há quem diga que dramaturgo não é uma profissão, mas antes uma ocupação: isso não corresponde à realidade”, frisa Paulo César Gonçalves, dramaturgo na CEC, recordando a cerimónia de abertura. “A forma como as pessoas encaram um determinado mester é que faz toda a diferença. Agradeço muito as oportunidades de que dispus, em dois projetos da CEC, um dos quais a cerimónia de abertura”.


Seguiu-se um espetáculo de rua, com direção artística dos La Fura Dels Baus, uma performance multimédia no Toural “de onde partem todos os encontros de Guimarães 2012 e onde se celebra o renascimento da cidade e a reimaginação da sua história”. A cidade encheu-se de pessoas, de música, de cor. Só no dia da abertura oficial a cidade recebeu cerca de 120 mil pessoas.


Para Paulo César Gonçalves “foi a envolvência dos vimaranenses que ‘salvou’ o certame, depois de todas as peripécias iniciais que quase colocaram em risco a sua realização. A frase “tu fazes parte” foi muito bem escolhida”, recorda. E a verdade é que todos fizeram parte. Muitos foram os vimaranenses que passaram de consumidores de eventos culturais a voluntários e deixaram-se envolver e ser parte de 2012. Luís Moura é exemplo disso. Considera “um enorme privilégio ver os eventos por dentro sem deixar de ter uma perspetiva de consumidor anónimo final”. De uma forma geral, explica, ser voluntário “foi fazer parte de algo que, quando começou, provocou uma sensação de maravilhamento. E isso não teve, nem tem, preço”, tendo estado em eventos que considerou “interessantes, diversificados e enriquecedores”. Contudo, admite “que nem todos os voluntários tenham tido a mesma sorte; do mesmo modo, nem todos os eventos foram interessantes ou proporcionaram aos voluntários uma experiência estimulante”.


Teresa Silva partilha da opinião de que ser voluntária na CEC foi “bastante enriquecedor. Há um orgulho em ser vimaranense que poucos conseguem explicar e acho que isso se sentiu bastante nesse ano”. Adiantou que conheceu vários artistas, trabalhou com eles, percebeu “a máquina por detrás de grandes eventos” e entendeu “também as dificuldades que isso acarreta”. Traz consigo várias histórias, suas e de amigos que conheceu. “Duas pessoas, que também se conheceram no voluntariado da CEC, são hoje casadas, apaixonadas e pais de uma linda menina que é minha afilhada”, conta à Mais Guimarães recordando ainda alguns dos eventos que mais a marcaram. “Um dos meus projetos favoritos foi o Mi Casa Es Tu Casa e creio que esse tipo de eventos mudou Guimarães, mostrando uma nova forma de apresentar arte, uma forma que aproxima os artistas de todos os cidadãos criando um ambiente propício à partilha”.

10 anos depois, o que fica?

Antes de ser Capital Europeia da Cultura, acredita José Bastos, “Guimarães já era reconhecida como um exemplo, como uma cidade com uma dimensão cultural e com uma estratégia cultural que estava a muita distância da generalidade das cidades em Portugal”. O ano de 2012 veio consolidar uma imagem que já existia. “Veio densificar a imagem que Guimarães tinha e tem de ser uma cidade com uma forte marca identitária, uma forte identidade ligada à história, uma cidade que não fica a olhar para trás, não fica a olhar para a história, e todos os dias constrói e reconstrói o seu futuro muito suportado e muito alavancado na criação artística e na dimensão cultural”.


Luís Moura acredita que a cidade começou a mudar culturalmente “quando lhe foi atribuído o título de Património Cultural da Humanidade. Tendo começado a figurar nos roteiros turísticos internacionais, a cidade começou a abrir-se culturalmente”. Na sua opinião, esse foi “o ponto de viragem”, tendo a CEC alavancado nesta mudança que vinha ocorrendo.


A forma de consumir cultura parece também ter sido alterada. Teresa Silva acredita que, depois desse ano, “aumentou a vontade e a curiosidade pelas diferentes áreas da cultura e isso tem vindo a ser bem alimentado pelo município e pelas várias associações culturais que existem em Guimarães”.


Agora, já com “distanciamento suficiente”, José Bastos conclui que “Guimarães ter sido capital Europeia da Cultura 2012 foi um dos grandes momentos de Guimarães falando de qualquer área de atividade”. Um evento que, diz, “marcou esta viragem que Guimarães teve e pode e deve continuar a ter. 2012 traduziu uma alteração do paradigma naquilo que é a visão da cultura em Guimarães e no país”. Contudo, gostava “que fosse reforçada esta dimensão cultural, que fossem criadas condições para que a criação artística continuasse a existir, e continuasse a existir cada vez de uma forma mais acentuada, que continuasse a ser feito um trabalho de afirmação e valorização da dimensão artística, que fossem continuados os apoios à criação artística, seja ela de natureza profissional, seja ela de natureza amadora”.


Para o programador, “Guimarães continua hoje a ser uma cidade uns degraus acima da generalidade das cidades em Portugal, do ponto de vista cultural”, mas “há muito a fazer” e há algumas coisas que é “com alguma tristeza” que vai assistindo. Concretamente, diz, continua “a não ver o Governo central a reconhecer a importância de Guimarães e a apoiar Guimarães, que foi Capital Europeia da Cultura e com resultados que são unanimemente reconhecidos como muito válidos. Continuamos a ver as estruturas de Guimarães sem qualquer apoio estatal ou com um apoio muito residual, não diferenciado, ao contrário do que acontece com as anteriores Capitais Europeias da Cultura, como Porto e Lisboa”.


A cidade tem uma oferta vasta e, ao mesmo tempo, tem imensos artistas e criadores. Paulo César Gonçalves sente “que se vem apostando, e o Município tem dado provas disso”, mas, por outro lado, também sente, “ao mesmo tempo, que os palcos das estruturas culturais, ou as ‘montras’, negligenciam os criadores locais. Não acredito em autossuficiência, e acho que podemos e é preciso estarmos abertos ao que é exterior, apontar para lá, trazer até cá, mas isso não significa, pura e simplesmente, não poder oferecer a possibilidades de voar a alguém”.


É inegável o impacto positivo da CEC, “a cidade ficou mais exposta” e, por isso, o dramaturgo acredita que há “um papel a desempenhar e a defender. Sem parentes ‘pobres’, note-se. É preciso equiparar e equivaler. Dar condições. É pena que parte substancial da oferta cultural da cidade não aponte aos vimaranenses em geral, mas a nichos”.

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